Semana On

domingo, 7 de maio de 2017

Mujica: A revolução tranquila – Maurício Rabuffetti





“Aqui há um ditado popular que diz que ninguém é mais que ninguém”

“Conhecer Mujica é constatar o quanto estamos submetidos a deformações de poder que transformaram nossos governantes em semi-deuses perdulários e insinceros, cercados de aparatos e ostentação, como se estivessem em outra esfera humana cumprindo (?) missões além da nossa compreensão” diz Miguel Ángel Bastenier no prefácio de Mujica: a revolução tranquila, ensaio biográfico do jornalista Mauricio Rabuffetti sobre a vida do ex-presidente Uruguaio.

A obra trata da trajetória do ex-guerrilheiro Tupamaro que alçou-se a presidência do país com um discurso no qual os valores de esquerda se debruçaram sobre a luta pelas liberdades individuais. “Uma verdadeira política progressista, aquela em que a esquerda é a esquerda, e que afeta a redistribuição de renda e a igualdade de oportunidades é virtualmente impossível em um mundo dominado pelo capitalismo neoliberal. Por isso, alguns homens de esquerda adotaram o discurso da esquerda moral, a dos direitos individuais”, afirma Bastenier resumindo bem o governo de Pepe Mujica.

Compreender o fenômeno Mujica é saber separar o discurso da prática. Não no mal sentido, de quem age de forma hipócrita diante do próprio discurso, mas no sentido pragmático, de compreender que há um caminho correto a ser seguido, mas, ao mesmo tempo, ser consciente de que há limites estruturais, educacionais e sociais que não podem ser superados sem o envolvimento da própria sociedade.

Prometemos uma vida de excessos e desperdícios, que no fundo, constitui uma contagem regressiva contra a natureza, contra a humanidade no futuro. Civilização contra a simplicidade, contra a sobriedade, contra todos os ciclos naturais e, pior, civilização contra a liberdade que significa ter tempo para viver as relações humanas e as únicas que importam: amor, amizade, aventura, solidariedade, família. Civilização contra o tempo livre que não tem preço, não se compra, e que nos permite contemplar e observar o cenário da natureza”, disse Mujica em um discurso na ONU em 2013.

Sua retórica anti-consumista, em prol de uma nova relação entre desenvolvimento, meio ambiente e felicidade, esbarrou inexoravelmente na prática governamental. Seu Governo não fracassou, mas não pode avançar em direção a políticas que reconstruíssem a dinâmica da economia, que invertessem a lógica do consumo desenfreado tão duramente criticada por ele.

Por outro lado, no campo dos direitos individuais, Mujica foi um campeão. A política de regulamentação da maconha, pioneira, é uma experiência que deve ser fruto de aprofundados estudos. A regulamentação do aborto, independente de nossas convicções pessoais, mas como um direito da mulher, foi outra luta bem sucedida de seu governo. Da mesma forma, a regulamentação do casamento entre pessoas do mesmo sexo transformou o Uruguai em um dos países mais tolerantes das Américas.

“Vivemos em um mundo no qual se acredita que aquele que triunfa deve possuir muito dinheiro, ter privilégios, uma casa grande, mordomos, muitos servidores, férias superluxuosas. Entretanto, eu acho que esse modelo de sucesso é apenas um modo idiota de se complicar a vida. Eu acho que quem passa a sua vida acumulando riqueza está doente assim como um toxicodependente, deveria se tratar”, diz Mujica.

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